quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Sínodo e Concílio


Dom Demétrio Valentini


Este mês de setembro se conclui com o Dia da Bíblia, coincidindo com a festa de S. Jerônimo, que neste ano cai de domingo. Todas convergências apontando para a importância da Palavra de Deus, que neste mês a Igreja coloca em destaque.A isto podemos somar outra informação, que começa a emergir com mais evidência, na medida que se aproxima o novo “Sínodo Geral”, que vai se realizar no ano que vem, sobre “a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”.
Assim se anuncia o tema da Décima Segunda Assembléia do Sínodo dos Bispos, a se realizar de 05 a 26 de outubro de 2008. Já foi divulgado o primeiro esboço do documento, que se destina a provocar as sugestões das Conferências Episcopais, a serem enviadas até o final de novembro deste ano, para que em seguida se prepare o “instrumento de trabalho” que servirá de base para as reflexões do próprio Sínodo. Este o processo do Sínodo, órgão criado pelo Papa Paulo VI, no final do Concílio Vaticano Segundo.
Ao criar os sínodos, na forma como se realizam agora, Paulo VI queria, na verdade, dotar a Igreja de um instrumento para continuar o processo conciliar. Os sínodos deveriam ir retomando os grandes temas do Concílio, levando em conta as novas circunstâncias que se apresentassem, mas sempre com a finalidade de prosseguir o processo de renovação eclesial iniciado pelo Vaticano II.
O Sínodo de agora, sobre “a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”, também se vincula diretamente ao Concílio, que abordou o mesmo tema e dedicou a ele um dos seus documentos mais bem elaborados, a DEI VERBUM, promulgado no dia 18 de novembro de 1965.
Pois bem, aí encontramos um recado muito especial, que o Sínodo de agora precisa dar à Igreja. Pois este assunto no Concílio protagonizou um dos momentos mais decisivos da renovação eclesial. O episódio merece ser recordado, para se perceber melhor a força que ele teve.
O assunto entrou em pauta ainda na primeira sessão conciliar, em 1962. Analisada a liturgia, foi introduzido o tema da Revelação, fortemente marcado ainda pelo clima de polêmica, implantado na Igreja desde os tempos da Reforma Protestante. O texto provisório reafirmava esta polêmica, contrariando a expectativa ecumênica que o Concílio tinha suscitado com tantas esperanças. Por isto, o texto foi sendo fortemente criticado, suscitando um clamor pela sua substituição. Mas na hora da votação, não se conseguiu a maioria requerida de dois terços para a reprovação de um documento preparatório. Isto causou um grande mal estar, dando a impressão de que as generosas intenções de João 23 seriam frustradas pela força conservadora ainda existente no episcopado mundial.
Foi então que João 23 interveio, pela primeira vez, no andamento dos trabalhos conciliares. Determinou, por conta própria, que o documento fosse abandonado, e que em seu lugar se preparasse outro, mais de acordo com os grandes objetivos de renovação eclesial e de superação de preconceitos históricos.
Este fato foi determinante para os rumos do Concílio. Ele marcou o fim da Contra Reforma na Igreja Católica. A partir daí muitos bispos se deram conta dos reais objetivos do Concílio, que João 23 já tinha proposto, mas que eles ainda não tinham percebido. Foi necessária esta enérgica intervenção de João 23, para recolocar o Concílio nos rumos dos seus verdadeiros objetivos. Pois bem, a história se repete. É preciso, de novo, apontar os rumos do processo conciliar, que corre o risco de ser esquecido, ou claramente contrariado.
O próximo Sínodo retoma o assunto que no Concílio serviu de pretexto para João 23 reafirmar os rumos da renovação eclesial. Que ele retome também o impulso de renovação conciliar e de superação da desunião entre os cristãos, que têm na Sagrada Escritura a referência comum para o diálogo ecumênico e reconstrução de sua unidade.
Precisamos de gestos que incentivem a renovação eclesial, não de gestos que a desautorizem.
*Dom Demétrio Valentini é Bispo de Jales (SP)

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